Candidatos do Enare denunciam erros em notas: “Frustração”

O Enare é organizado pela Ebserh, com apoio da FGV, e conta com a adesão de mais de 160 instituiçõesDivulgação

O Exame Nacional de Residência (Enare) 2025, conhecido como o “Enem dos residentes”, tem recebido muitas críticas devido às inconsistências nos cálculos das notas dos participantes, que alegam ter sido prejudicados por falhas na etapa de análise curricular.

A prova é uma das principais portas de entrada para programas de residência para profissionais de saúde no Brasil. Neste ano, 89 mil candidatos concorrem a 8,7 mil vagas em mais de 160 estabelecimentos de saúde do país inteiro.

O profissional, que pode atuar em diferentes áreas da saúde, é avaliado a partir de uma prova, com peso de 90% da nota, e de uma análise curricular do histórico dos alunos, que equivale a 10%.

Entretanto, após divulgação dos resultados, vários participantes alegam ter sido prejudicados pelo cálculo da nota, uma vez que cumpriram todas as exigências do edital e, mesmo assim, não pontuaram. Ao mesmo tempo, alguns participantes receberam notas mais altas por certificados que sequer apresentaram.

Um exemplo, para se ter uma noção: imagine que parte dos inscritos do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) tirasse zero na redação, com a justificativa de que não escreveram o texto. Entretanto, eles escreveram, o que consta no “espelho” da redação, divulgado pelo Inep.

A polêmica em relação às notas começou no dia 8 de janeiro, quando os resultados preliminares das análises de currículos foram publicados. No dia 14, novas notas foram divulgadas após a FGV e a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) tornarem “sem efeito” o resultado da primeira análise curricular. Com isso, os alunos que se sentiram prejudicados entraram com recurso no site do Enare.

O problema é que, no dia 21, os resultados pós-recursos foram divulgados e, ainda assim, parte dos estudantes alegam que continuaram prejudicados: mesmo cumprindo todos os requisitos acadêmicos, a nota seguiu zerada no histórico escolar, sem nenhuma justificativa específica.

Nas redes sociais, as reclamações são diversas. Algumas pessoas questionam o porquê da maioria das vagas estarem disponíveis para quilombolas em vez de ampla concorrência, sugerindo que a FGV errou novamente na distribuição de vagas.

Gente, a saga ENARE continua…

Colocaram todas as vagas na modalidade de acesso errada. A instituição tinha liberado edital com ampla concorrência e tá tudo quilombola.

Tão perto de desistir… tão tão

— calopsita (@marianblau2) January 28, 2025

Parece que a FGV fez um sorteio e decidiu corrigir a análise curricular de alguns candidatos e deixou a dos outros ainda zerada. Esse foi apenas mais um capítulo do Enare.

— Entidade Clínica (@Sulfassalazina) January 14, 2025

Quem organiza o processo seletivo?

O processo seletivo é realizado pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), vinculada ao Ministério da Educação (MEC), em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Portal iG entrou em contato com a Ebserh e a FGV, mas as instituições não retornaram. O espaço segue aberto para manifestação.

Além disso, o Portal iG entrevistou três candidatas que se sentiram prejudicadas pela análise curricular do concurso. Confira os relatos:

“Brincadeira com o futuro”

A enfermeira Gabriella Esteves Gonçalves, de Minas Gerais, está entre os participantes que foram lesados pela análise curricular do Enare. 

De acordo com a jovem, que se formou no segundo semestre de 2023 e prestou o exame pela segunda vez, a nota da análise curricular dela veio “completamente errada”, mesmo após entrar com recurso contra o sistema três vezes.

“Estou com histórico que vale, no meu caso, 40 pontos, além de 5 certificados com o valor de 1,5 ponto que vieram errados. Estou sendo lesada em 41,5 pontos, mas entrei com recurso na nota final e foi indeferido”, diz.

Segundo Gabriella, a nota corrigida permitiria sua admissão em três instituições. Sem a correção, esse número diminui para 1.

“Estão fazendo vista grossa. Uma chateação danada. Uma brincadeira com o futuro”, lamentou.

“Frustração”, diz psicóloga

Outra profissional prejudicada no processo seletivo foi a psicóloga Aryele Pinto Emídio dos Santos, de Salvador (BA). De acordo com ela, a FGV não deu a nota nos certificados que comprovam a realização dos projetos de extensão. Com isso, ela deixou de ganhar 8 pontos na análise curricular. 

“Mesmo com recurso, eles não aceitaram, e não deram justificativa pelo qual o recurso foi negado. Na residência, qualquer ponto faz uma diferença absurda, já que pra cada programa são no máximo 3 vagas, a maioria tem apenas 2”, diz a psicóloga, que escolheu a palavra “frustração” para definir a experiência.

A jovem conta que, como todos os recursos do concurso já foram indeferidos, se ela optasse por entrar com um processo contra as instituições, teria que pagar, pois seria de cunho administrativo.

“Infelizmente não tenho mais o que fazer. Vou só concorrer com a nota que fiquei mesmo e rezar para conseguir ser aprovada”, diz.

Injustiça

A enfermeira Fernanda Stall Correa, de Curitiba (PR), havia se preparado para a prova durante todo o ano de 2024. Atualmente, ela está finalizando a primeira residência em urgência e emergência pela Prefeitura de Curitiba, e se inscreveu no Enare para tentar a segunda, em obstetrícia.

Aconteceu com ela o mesmo que muitos estudantes têm relatado: ela anexou 16 documentos para a análise de currículos, mas a nota veio zerada, com o sistema afirmando que não havia nenhuma documentação. Fernanda entrou com recurso, mas o edital foi cancelado.

Dias depois, foi liberada uma nova análise curricular e, ainda assim, vários documentos anexados pela jovem foram classificados como “não está de acordo com os requisitos editalícios”, entre eles o histórico escolar, que valia 50% da nota.

Ela entrou com recurso pela segunda vez, pois eles “não colocaram o motivo que meu histórico estava sendo negado, sendo que, de acordo com o edital, precisaria ter: papel timbrado, assinatura do responsável da IES, nome e notas das disciplinas, e o meu possuía todos esses dados”.

“Me preparei ano passado inteiro para a prova, mas fico me sentindo bem injustiçada, creio que isso deve ter acontecido com muitas pessoas”, diz a enfermeira.

“É bem frustrante, por que se minha nota fosse baixa por falta de pontuação minha é uma coisa, mas com o tanto de sucessão de erros, não dá para saber se minha nota está certa mesmo”, continua, afirmando que só saberá a sua colocação amanhã.

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