Atendimento na Clínica Renal de Roraima foi suspenso nesta segunda-feira (17) porquê governo deve R$ 8 milhões. Sesau afirma que tem feito tratativas para solucionar problema. Jupy da Silva faz hemodiálise há 17 anos
João Gabriel Leitão/g1 RR
Pacientes que precisam de hemodiálise não conseguiram fazer o procedimento nesta segunda-feira (17) após a Clínica Renal de Roraima suspender os atendimentos. A empresa, que tem dois contratos com o governo, afirma não ter condições financeiras de continuar o serviço porque o estado deve mais de R$ 8 milhões.
Sem o serviço na Clínica Renal, alguns pacientes foram encaminhados para o Hospital Geral de Roraima (HGR), o maior do estado. A Secretaria Estadual de Saúde (Sesau), responsável pelos contratos, disse que tem feito tratativas com empresa para o pagamento dos valores em atraso e chamou a decisão de “atentatória à saúde pública”(leia a nota na íntegra abaixo).
Nesta manhã, ao chegarem na porta de Clínica Renal para mais uma sessão de hemodiálise, que precisa ser realizada três vezes na semana, pacientes se depararam com o ofício enviado pela empresa à Sesau. O documento informava sobre a paralisação dos atendimentos devido à falta de pagamento para a continuidade do serviços.
Pacientes que precisam de hemodiálise ficam sem atendimento em Roraima
Um dos pacientes afetados com a suspensão foi o idoso Jupy da Silva, de 76 anos. Há 17 anos ele faz hemodiálise. No último sábado (15) ele fez uma sessão e agendou a próxima para esta terça-feira (18). Quando soube que o serviço havia sido suspenso, ficou preocupado e foi até clínica em busca de solução.
“Não pode faltar [atendimento]. Qualquer paciente que passe uma semana ou 10 dias sem “dialisar” vai a óbito. O governador é responsável por isso. Se eu ficar mais dias sem, minha vista vai começar a falhar e o coração vai parar, aí eu vou a óbito”, disse, preocupado.
Jupy recebeu na Clínica Renal a informação que seria encaminhado para o HGR. Mas, a preocupação dele é se o hospital vai ter estrutura para receber os cerca de 314 pacientes que semanalmente fazem o procedimento, fora os que estão internado na unidade.
“Teria que ter, no mínimo, umas 30 máquina. Não adianta, se não tiver, vai matar gente”, disse, acrescentando que as sessões de hemodiálise duram, em média, três horas e meia por paciente.
O atendimento na Clínica Renal ocorre por turnos ao longo do dia, em que cada grupo de 50 pessoas é atendido em horários específicos, totalizando cerca de 150 pacientes entre manhã, tarde e noite. Com a paralisação da prestação de serviços ao governo de Roraima, a unidade informou que só está atendendo mediante convênio particular – o que não é a realidade da maioria dos pacientes que dependem do SUS.
“Vamos imaginar que chegue 60 pessoas para dialisar [no HGR] e que não podem ficar para amanhã. Esses pacientes podem entrar em coma e vão a óbito. Se não normalizar, depois de 10 dias já não tem ninguém vivo”, diz Jupy.
“Clamamos as autoridades públicas, para que possam adotar as medidas cabíveis para garantir o atendimento aos pacientes dos serviços de hemodiálise crônica, para que possamos resguardar o direito fundamental à vida e saúde”, cita o ofício da empresa.
Daiane é filha de uma paciente idosa que já ficou internada 20 dias por ficar quatro dias sem hemodiálise
João Gabriel Leitão/g1 RR
Filha de uma paciente com problema renal crônico e que há nove anos faz hemodiálise, Daiane da Costa Pontes também explicações para o impasse entre a Clínica Renal e o governo. A preocupação dela é que caso a suspensão se mantenha, os pacientes podem agravar o quadro e precisar de internação.
“Minha mãe uma vez passou quatro dias sem ‘dialisar’ e ficou 20 dias internada no HGR. Até agora não temos nenhuma resposta [do governo]”, relatou emocionada.
“Estão mandando todo mundo ir pra casa e depois vão ligar para ir lá dialisar [no HGR]. Não pode [ficar sem atendimentos]. São vidas”.
O paciente Ian Alves, de 35 anos, tinha uma sessão de hemodiálise marcada para esta segunda. Ele também foi encaminhado para o HGR, mas sabe se seria atendido por conta da alta demanda.
“Tem que ir lá no HGR ver o que eles vão fazer da nossa vida. Eu acho que não é o suficiente para gente que faz hemodiálise [lá no HGR]”, disse.
O que diz a Clínica Renal
O gestor de qualidade da Clínica Renal de Roraima, Fhellipe Godoi, informou que a empresa enviou dois ofícios em que alertou sobre a paralisação devido à falta de pagamento por parte do governo. A primeira notificação foi enviada no dia 19 de maio deste ano. No documento, consta o carimbo de “recebido” da Secretária de Saúde do Estado, Cecília Lorezon.
O segundo ofício, que comunica a paralisação efetiva devido à dificuldade financeira, foi enviado na última sexta-feira (14), e também foi recebido por Lorezon. Ele nega que a Sesau tenha feito tratativas de forma oficial para resolver o problema.
Goddoi informou ainda que os equipamentos da Clínica Renal que ficavam no HGR e no Coronel Mota, onde pacientes em estado de emergência eram atendidos, foram retirados das unidades pelo governo.
“O que não avisaram foi eles quando tiraram a gente do “agudo” [como são chamados os pacientes que fazem hemodiálise nos hospitais]. Mandaram a gente tirar as coisas de madrugada. A gente chegou lá, foi praticamente expulso, tivemos que sair tirando todas os nossos equipamentos de madrugada”, contou o gestor.
Ainda segundo Goddoi, os pacientes encaminhados ao HGR foram comunicados na unidade de que teriam as sessões de hemodiálise reduzidas, de três horas e meia, para uma hora e meia de sessão, devido ao número reduzido de equipamentos. Isso daria mais agilidade aos atendimentos, mas segundo Goddoi, perderia a eficiência e colocaria o tratamento em risco.
O governo não informou a quantidade de máquinas e qual a estrutura do HGR para atender os pacientes que eram da Clínica Renal.
Ofício enviado à Sesau foi colocado na porta da Clínica Renal de Roraima
João Gabriel Leitão/g1 RR
O que diz o Governo sobre a Clínica Renal
A Secretaria de Saúde classifica como atentatória à saúde pública a postura da referida empresa em suspender os serviços de terapia renal aos mais de 300 pacientes crônicos do SUS (Sistema Único de Saúde), haja vista que se tratam de vidas que necessitam de tratamento emergencial e que não podem interromper o tratamento.
A Sesau ressalta ainda que as tratativas de pagamento de valores em atraso ocorrem normalmente, e que vem mantendo contato com a Clínica Renal de Roraima no sentido de sanar quaisquer dúvidas em relação à importância dos serviços prestados, em conformidade com os princípios da administração pública.
Vale destacar que, de acordo com o Contrato Nº 91/2020, qualquer alteração nos procedimentos realizados, assim como possíveis interrupções no atendimento, deveriam ser comunicadas previamente à Secretaria, dentro do prazo de 30 dias, o que não foi respeitado pela empresa, que tomou a decisão de suspender os atendimentos aos pacientes no dia 15, deixando vidas que depende do serviço de terapia renal vulneráveis, incorrendo em risco de morte.
Paralelo a isso, a Sesau vem atendendo a demanda dos pacientes que necessitam de terapia renal, haja vista que, conforme relatório de atendimentos dos dias 11 e 12, mesmo antes da migração de contrato, havia mais de 20 pacientes que estavam sem atendimentos pela Clínica Renal;
Além disso, a pasta realizou recentemente o credenciamento de três empresas que atuam no setor, incluindo a própria Clínica Renal de Roraima, que demonstrou interesse em continuar a prestar o serviço ao Estado. A atitude de interrupção do serviço causa espanto, uma vez que todo o impasse está sendo negociado.
A Sesau encerra reforçando que se mantém empenhada em atender as necessidades dos pacientes, organizando de forma imediata o fluxo de atendimento, a fim de não comprometer a continuidade do serviço.
*Estagiário sob supervisão de Valéria Oliveira
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Pacientes ficam sem hemodiálise após Clínica Renal suspender atendimento por não receber do governo de Roraima
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