Empresa de suspeito de financiar garimpo ilegal é contratada para furar poços na Terra Yanomami e MPF pede suspensão do trabalho


Ministério Público Federal também pede proibição de acesso ou permanência dos sócios da empresa no território indígena. Pedido deve ser analisado pela 4ª Vara Federal de Roraima. Prédio do Ministério Público Federal em Roraima.
Yara Ramalho/g1 RR/Arquivo
O Ministério Público Federal (MPF) pediu à Justiça Federal em Roraima a suspensão imediata do contrato com a empresa Cataratas Poços Artesianos, que irá realizar a perfuração de poços na Terra Indígena Yanomami. A empresa é do empresário Rodrigo Martins de Mello, conhecido como Rodrigo Cataratas, investigado pela Polícia Federal por suspeita de dar apoio à exploração ilegal de ouro no território.
A informação foi divulgada na manhã desta quinta-feira (4) pelo órgão. O pedido deve ser analisado pela 4ª Vara Federal de Roraima.
Na ação, o MPF também pediu a proibição de acesso ou permanência dos sócios da empresa no território indígena. Para o órgão, além de irregularidades no contrato com a empresa, a contratação teria o potencial de “ser utilizada como tentativa de conferir” legitimidade à manutenção da presença de garimpeiros na Terra Indígena Yanomami.
“Viabilizando a prática de infrações penais, especialmente neste momento sensível, permeado por uma atmosfera de insegurança e terror, em que o Estado brasileiro desenvolve esforços para reverter a crise humanitária enfrentada pelo povo Yanomami, com ações da retirada de invasores do território indígena”, completou o órgão.
No dia 10 de março, o Ministério da Defesa contratou a Cataratas, por dispensa de licitação, para construir um poço artesiano na região de Surucucu, no 4º Pelotão Especial de Fronteira (4º PEF), com um orçamento de R$ 185 mil.
A empresa também foi contrata pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde, para instalação de um poço na Unidade Básica de Saúde Indígena de Surucucu, uma região de referência para atendimentos médicos na Terra Yanomami.
O g1 tentou contato com os órgãos para comentar sobre o assunto, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
Em 2022, a empresa e respectivos sócios foram denunciados pelo MPF pela exploração ilegal de minérios na terra indígena. As pessoas físicas, entre outros delitos, ainda respondem por lavagem de bens, por integrarem organização criminosa e por dificultarem as investigações.
Segundo as investigações, a organização criminosa fornecia infraestrutura para outros grupos de garimpo, com a operação irregular de aeronaves e o transporte ilícito de combustíveis, além de promover diretamente a extração em alguns pontos da TIY e agir na comercialização de minérios, escoando o produto da lavra ilegal.
“Ressalta-se que a atividade de perfuração de poços artesianos funcionava justamente como ferramenta de ocultação entre recursos de origem lícita e ilícita, operando, portanto, como mecanismo de atos de lavagem de bens e valores pela empresa”, explica o Ministério Público.
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O poço atualmente existente no PEF Surucucu estar em processo de aterramento e tem indicativos da presença de metais pesados, efeito deletério comum da prática de garimpo ilegal.
Ao analisar o processo administrativo conduzido pelo Ministério da Defesa, o MPF identificou que a empresa estaria impedida de contratar com órgãos públicos, em razão de irregularidades fiscais e de pendências quanto à demonstração da qualificação econômico-financeira.
Além disso, a empresa Cataratas, ao tempo da contratação, estaria impedida de licitar com o poder público em razão de sanções impostas a outra pessoa jurídica vinculada ao grupo.
O órgão afirma ainda que manter o contrato seria permitir que a empresa obtivesse lucro na prestação de serviços que se tornaram necessários tão somente pela anterior prática de infrações a ela imputada. Sobre a execução da obra, esclarece-se que, há nos autos, pesquisa de preços a indicar, em tese, a viabilidade de execução do contrato por terceiros.
“O contexto narrado soa como possibilidade de que o infrator, ao qual já incumbiria o dever de reparar o dano, seja remunerado por uma obra cuja necessidade é fruto de um ato ilícito do próprio anterior, fulminando, a um só tempo, a boa-fé objetiva, a teoria dos atos próprios, o princípio do poluidor-pagador, a exigência constitucional da responsabilidade ambiental e, até mesmo, o simples bom senso”, disse o procurador da República, Matheus de Andrade Bueno.
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